quinta-feira, 13 de maio de 2010

Ele amava a música, mas sua vida daria um filme


Confesso que esperava ver homenagens naquela fria tarde de domingo, 9 de maio. Porém, não posso esconder minha emoção ao escrever sobre aquilo que vi, ouvi e senti quando da despedida ao maestro Mauro Cerdeira. Sua morte, aos 76 anos, poderia significar o final de um ciclo, mas me parece ser o início de uma nova etapa na cultura musical da cidade.

Isso só seria possível em razão do legado deixado por Mauro Cerdeira. Afinal de contas, bastariam poucos minutos de conversa com os amigos para perceber que estávamos diante de uma figura incomum.
A paixão pela música o levou à Rádio Tupi. Estamos falando da época de ouro do rádio, em que as emissoras tinham seu casting. Na Tupi, era responsável pela cópia das partituras. Algo inimaginável nos dias atuais, de massificação da produção cultural.

Porém, seria em Limeira que sua trajetória ganharia contornos de um daqueles personagens marcantes de filmes. Durante 50 anos, foi maestro da Corporação Musical Henrique Marques, fundada em 1860 e a quarta banda marcial mais antiga do Brasil.

Histórica banda, histórico regente. Mauro Cerdeira foi o quarto maestro da Henrique Marques em quase 150 anos de vida. Recentemente, por conta de uma doença, passou a batuta para Fernando Barreto. Não sem antes contar a mim que, “se um dia Deus me perguntar o que eu fiz com o dom que Ele me deu, vou dizer que aproveitei nota por nota".
A música estava em sua vida particular. Casou-se com dona Aparecida, ela que também nutria uma paixão pela música – atuou como cantora de rádio. Os quatro filhos são músicos. Um deles, Jorge, regeu a banda na Academia da Força Aérea, em Pirassununga. Maurinho, por sua vez, segue os passos do pai nas retretas da “Henrique Marques”.

Há ainda uma lista infindável de músicos que passaram pela formação rígida de “seo” Mauro. Eles sabiam que, em cada aula, diante deles, estava uma pessoa diferenciada, que precisou reservar um cômodo de sua residência para guardar os prêmios conquistados durante a carreira. Sabiam também que Mauro era um exemplo de que apenas o dom não é garantia de um músico de qualidade, mas que a persistência é tão importante quanto a teoria.

Lá estavam eles, naquela fria tarde de domingo, para homenagear Mauro Cerdeira. “Hoje não vou conseguir tocar”, lamenta-se Maurinho, diante dos colegas de banda. Jorge não resiste à lembrança presente. Após a execução de “My way”, eternizada por Frank Sinatra, Jorge vai a Fernando Barreto e aos músicos para agradecer pela homenagem.

Pouco antes do último adeus, o prefeito Silvio Félix diz que homenagens oficiais representam o mínimo que a cidade pode fazer pelo maestro. “A preservação da cultura é o compromisso que assumimos diante dele”, completa o prefeito.

Sinal de que a retreta dominical em Limeira tem que continuar.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Comodismo: o verdadeiro vilão da imprensa emergente

Geograficamente, a América Latina possui uma ótima localização. Pena que boa parte do mundo só se lembre dos países que a compõem apenas dessa maneira, ou seja, apenas como um pedaço terra. Apesar da riqueza cultura e natural, a posição perante outros países, considerados desenvolvidos, ainda é rasa e insólita.

E a culpa por tal desprezo não vem de fora. Se pararmos para analisar, o comodismo é o principal vilão de tudo isso. Desde pequenos a primeira informação que recebemos nas aulas de Conhecimentos Gerais e de História é que somos um país novo e em desenvolvimento. E o pior, crescemos com esse fardo calados, sem contestamentos.

O bombardeio prossegue com as comparações: a Europa detém o poder religioso; a Ásia é sabia e mais antiga e a America do Norte, a sensação atual, domina a tecnologia e a eficiência diplomática. E nós, o que temos? Somos miseráveis humanos descendentes de várias raízes indígenas, colonizados por portugueses famigerados de riqueza e mulheres bem afeiçoadas.

O complexo de inferioridade foi estabelecido. Qual o prazer de viver e morrer aqui, na terra onde canta os sabiás? Diante disso, o jornalismo deveria ter a função de formar, direcionar e mostrar o potencial local. No entanto, a Grande Imprensa - formada por veículos grandes e providos de dinheiro -, norteia suas programações em notícias voltadas para o centro do mundo.


Mas o que realmente é o centro do mundo? Essa pergunta feita por muitos revolucionários e anticapitalistas ainda está no ar. Com tantas características singulares, riquezas naturais, histórias para contar do nosso lado, a atenção dos jornalistas poderia e deveria estar antenada nos acontecimentos locais, muito mais que os estrangeiros.


Por enquanto, porém, essa realidade continua em discussão e deixando muitas pessoas órfãs de informação real sobre suas raízes. Quem sabe a tal Imprensa Alternativa tenha fôlego para continuar a resgatar essa lacuna de informação na sociedade ainda desprezada pela máfia capitalista e globalizada. Pois, a notícia na dose certa é remédio, mais que isso se transforma em guerra e volta a instaurar a solidão.

Donson: um contestador visionário

Lá vem ele, todo perfumado pelo corredor da faculdade. Religiosamente, cinco minutos antes de o sinal bater, Daniel Marcolino, mais conhecido como Donson, entra na sala esbanjando a todos um “oi” americanizado. E não tem como o deixar passar em branco. Herdeiro de uma pele afro-descendente da cor do pecado, o estudante de jornalismo é um dos mais altos de sua sala. Com 1,83 metro de altura, ele gosta de vestir roupas coloridas e que valorizam sua estatura. Camisetas mais justas, calças bem delineadas e, quando pode, sempre abusa em algum acessório, como uma corrente ou pulseira.

Donson também é mais que um corpo. Ele desfruta, e muito, de suas habilidades intelectuais. Dono de uma boa oratória, o aspirante no jornalismo domina claramente a língua portuguesa e passa muito bem em um desafio no inglês. Daniel nasceu em abril, mais precisamente no décimo primeiro dia do mês. Apesar da pouca idade, ele aparenta ter mais que 21 anos, não pela conjuntura física, mas, sim, pela maturidade em muitos assuntos, principalmente em se tratando de literatura.


Apaixonado por obras brasileiras, ele se considera um discípulo da escritora Clarice Lispector. Além disso, seu repertório musical sempre se baseia no rock tradicional inglês do Cold Play, passando pela melodia suave de Alanis Morrisette. Mas, como todo jovem, Donson também não dispensa um estilo eletrônico. Pelo menos uma vez por mês, a diversão é na balada com os amigos.


Recentemente, o jovem jornalista participou de um intercâmbio nos Estados Unidos. A experiência de pouco mais de três meses no país desconhecido resultou em diversas mudanças para ele. Uma delas foi a oportunidade de perceber que ele pode ir ainda mais longe, não apenas geograficamente, mas humanamente. Da viagem, muitas roupas e futilidades, mas também muito conhecimento, como o aperfeiçoamento do inglês.


Visionário e contestador, Donson se prepara para um novo desafio. Após a faculdade, o plano é pegar o “canudo” de formatura, embarcar em um cruzeiro marítimo e seguir rumo à Europa. Lá, ele pretende trabalhar como tradutor e voltar para o Brasil com o bolso cheio de Euros. Talvez esse seja um passo importante para a sua carreira, que promete alçar voo pelo mundo afora.

Devaneios de um velório pra lá de anormal

VIÚVA

As pessoas me olham e me rodeiam. Querem desejar sentimentos, mas não aceito. Afinal, sentimento nenhum existiu entre mim e ele. Tudo foi apenas uma vida de desilusões e sem alicerce. Um amor desnutrido e pouco famigerado. Até que tentei amá-lo, não posso mentir. Mas não teve jeito. O que me atraía nele era apenas o volume da conta bancária. Uma vida de luxo. Tive. Mas do que adiantou? Estou velha, na tenra idade e agora ninguém vai me querer.

Meu sonho sempre foi de encontrar um grande amor, quem sabe um príncipe encantado. No entanto, acabei me casando com o pai do meu tão sonhado príncipe. Trinta anos mais velho. No começo nem levei isso em conta. Mas deveria. A nossa relação na esfera social era ótima. Já a dois, sequer tinha excitação. Fazia apenas a minha parte na cama e logo dormia.

Agora, depois de muitas compras, viagens e futilidades, estou aqui ao pé desse caixão. Não me veem lágrimas para derramar. Não sei o que fazer. Estou rica e sozinha e mal amada como sempre. Mas não perco tempo. Ele pensa que não o vi, mas atentei-me aos olhares do pai da minha melhor amiga. Tudo bem que é desprovido de formosura, mas tem lindas mansões na Europa. Ah, que vergonha. Será que devo retribuir os olhares? Vou esperar pelo menos fechar o caixão. Não quero que meu marido leve uma má impressão de mim.


VELA

Passam das 20h e somente quatro pessoas chegaram. Está frio lá fora e para ajudar o aquecedor parou de funcionar. Parece que a noite vai ser tranqüila por aqui a não ser pela última família que aos poucos começa a chegar. Estão animados e com roupas coloridas. A que parece ser a filha mais velha é a mais coerente. Está adequadamente trajada e chora ao lado do caixão. Por outro lado, a suposta viúva, vaidosa e com poucos panos sobre o corpo, esnoba a situação.

Trabalho aqui há tanto tempo que até perdi as contas. Mas com toda certeza, nunca quiseram me derreter tão rápido como nesse velório. A todo o momento eles me olham, como se eu fosse a culpada pela demora do encontro familiar não acabar. O ponteiro do relógio, que anda a passos curtos e bem cadenciados já pesa sobre mim como uma bola cheia de areia.

Ufa! Estou indo embora, mas acho que essa confusão vai continuar sem mim. Coitada da próxima colega de trabalho que chegar. O turno dessa noite não vai ser fácil. O clima tá pesado aqui e com certeza deve piorar.

DEFUNTO

Não queria partir. Gostava da minha vida e acho que ela gostava de mim também. Posso dizer que, apesar de tudo, era feliz. Era rico, tinha uma mulher linda, muitos amigos e uma ótima posição social. Antes de partir, porém, não consegui cumprir uma meta em minha vida: ser pai. Adoro crianças e sempre sonhei em ter uma para alegrar a minha casa. Pena que a minha mulher era estéril ou fingia ser. Falo isso porque sempre desconfiei que ela não quisesse compartilhar comigo essa felicidade. Não sei o exato motivo, mas sempre a respeitei.

E agora, será que terei outra vida e nela a oportunidade de ter filhos ainda? Perguntas que ninguém me respondeu até o momento. A única coisa que sei e posso ver são essas pessoas ao meu lado. A visão está um pouco ofuscante pelo véu que cobre meu rosto. Estou sentindo falta de algumas pessoas. Onde estão meus amigos? Nem a minha esposa chegou.

Passaram duas horas e nada dela chegar. Estou preocupado, mas não posso mais esperar. Tenho que ir. Sei que ela virá e ficará comigo até o final. Confio nela e ela não vai me decepcionar. Adeus minha querida!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

As neuras de um observador cansado

Cansei da mesmice. Cansei de ser a mesma pessoa sempre. Cansei de falar os mesmos termos. Cansei de olhar e não ser olhado. Cansei de ver que existem pessoas sem perspectivas. Cansei!
Mas do que adianta perder o fôlego pelas pessoas? Neste mundo de meu Deus, como solfeja um amigo, nas horas de desespero, nada é para sempre ou ao menos resiste por muito tempo. Existem pessoas e pessoas.

Minha indignação voltou. Não sou exibicionista, mas amo observar a falta de discrição dos outros. Talvez isso levante barreiras. Querer entender demais as pessoas pode ser um erro. Mas, se não as entendo, como as conhecerei? Perguntas e colocações difíceis. Sim, eu sei.

Mas, não deixo isso me carregar. Tenho meus conceitos e não quero ficar preso à mesmice dos outros, porque de cansado já me basta estar. Espero que pessoas venham agregar coisas boas a mim. Não tenho como objetivo sustentar desejos reprimidos. Quero galgar meus sonhos com quem merece.

Cansei mais uma vez. Agora de tentar explicar a diferença de pessoas e pessoas neste mundo de meu Deus. Mas me recupero logo, pois ficar cansado por um tempo faz bem. Instiga à reflexão, aos murmúrios insólitos. Tira-nos da alcova e nos traz de volta a realidade.

Para um observador, acho que canseira não pega bem. Mas volto a observar e quem sabe não tenha tempo para relatar essas minuciosidades da vida alheia. Afinal, fica cansado quem quer e descansa quem tiver juízo. Acho que vou fazer o mesmo.